Manuel Luís Goucha

Dez anos depois, o apresentador de televisão, que foi a primeira capa da Revista Saúda, em novembro de 2015, volta a abrir o coração e a falar da sua vida, das aprendizagens, dos desafios, das estratégias que encontrou para se tornar no homem que é hoje, e dos projetos em que está a trabalhar.

Como começa os seus dias?
Habitualmente, os meus dias são de trabalho. Cumpro-me no trabalho, se bem que nunca acho que vou trabalhar, vou viver! Costumo preparar os meus compromissos televisivos no dia anterior, por isso, é arranjar-me e sair de casa, apesar de agora as coisas serem um pouco diferentes.

Tem especial atenção à preparação?
Esse é o meu segredo, a minha marca. O meu caminho para chegar ao sucesso tem a ver com a preparação.

Já era assim em criança?
Sim, era muito “marrão”. Estudava muito porque queria ser o melhor. E por isso pesquisava, era curioso. Essa paixão pelo saber vem da minha adolescência. Às vezes, acontece-me tirar da fase de preparação o maior dos prazeres, porque nem sempre as conversas me acrescentam tanto quanto a pesquisa.

O que faz nesses casos?
O segredo da conversa está em ouvir o outro. Há muitas perguntas que surgem na sequência daquilo que o convidado me dá e essa também é a magia da interação com as pessoas. Mas tenho uma regra de ouro: o protagonista não pode ser o entrevistador, mas sim quem está do outro lado.

Essas conversas permitem-lhe evoluir?
Sim, acho até que fui resolvendo muitas questões da minha vida através desses momentos. Às vezes penso «espera lá, eu também já senti isto. Espera lá, não resolvi aquilo da melhor maneira. Espera lá, aqui está um caminho».

Costuma dizer que gosta de ser velho. Como é que se envelhece de forma saudável?
Primeiro, há que agradecer à vida pelo facto de estar prestes a completar 71 anos! Depois, procuro manter-me ativo. Tenho o exemplo da minha mãe, que morreu no ano passado, com 101 anos, e em plena posse das suas facultades cognitivas. Isto é um processo, sei que tudo vai acabar, mas isso para mim é cada vez mais pacífico porque tenho a consciência de que tive a vida que sempre quis.

A fazer televisão?
Sim, sempre quis ser apresentador de televisão. Essa era a minha janela para o mundo, a única coisa que me restava para sonhar, ainda que fosse uma televisão censurada na altura. Sabia que um dia iria fazer parte deste mundo.

 

«quando vou para a televisão, vou viver!»

Já falou da sua mãe. E o seu pai?
Sempre fui uma criança que cresceu muito consigo própria, com as suas brincadeiras, com os seus sonhos e sem uma figura paterna. Nunca me fez falta nem nunca senti saudades, porque não se tem saudades daquilo que nunca se teve.

Enfrentou uma depressão há 32 anos. Como é que ultrapassou esse período?
Temos de estar atentos aos sinais de alerta. No meu caso, sentia uma tristeza sem fundo. Comecei a não ter gosto em viver, a não dormir, a não ter cuidado comigo e a deixar de ter objetivos. Isso coincidiu com o fim de uma relação de 11 anos e com um desaire televisivo, chamado “Momentos de Glória”. Foi um acumular de situações que beliscaram quase fatalmente a minha autoestima. Comecei por ir a um psiquiatra, que me deu um medicamento, mas achei que isso por si só não ia resolver, ia apenas mascarar os sintomas. Queria ir à raiz do problema. Então, guardei o medicamento e pedi ajuda à Teresa Guilherme, que me recomendou a sua psicanalista, a Manuela. Lembro-me de ir todas as quartas-feiras à consulta e sair de lá a sentir-me poderoso e com força para ganhar mais uma semana.

Consegue libertar-se facilmente do que não lhe faz bem?
Completamente, sejam pessoas ou situações, mas foi algo que treinei com a minha terapeuta. Ela costumava dizer-me «O Manuel Luís tem a capacidade de deitar fora tudo aquilo que não lhe acrescenta, faça isso».

Gosta de receber pessoas em casa?
Sim, quando as convido [risos]. Costumo fazer isso mais no monte [no Alentejo], e quando recebo gosto de preparar mesas muito bonitas. O ato de receber, e sobretudo receber à mesa, é muito importante na vida social de uma família e, portanto, tudo tem de ser pensado ao pormenor.

Tem muitos amigos?
Não, tenho um lote de amigos muito pequeno. Tenho centenas de conhecidos com quem desenvolvo uma relação de estima. Mas, para mim, um amigo é um bem maior, e por isso tenho meia dúzia, nem isso.

Adquiriu recentemente uma propriedade em Monforte. Com que finalidade?
Pretendo desenvolver a parte agrícola da minha empresa. Fazemos criação de ovelhas e temos 28 hectares de oliveiras, que dá uma média de 20 toneladas de azeitona, com a qual fazemos azeite, que é vendido ao lagar. Também temos cavalos em dressage, a serem treinados, e que depois são vendidos. Nesta propriedade que adquirimos agora vamos investir numa vacada. 

Qual é a sua relação com as farmácias?
As farmácias são um antídoto para a solidão, sobretudo nos meios pequenos. Tenho a mesma farmácia há dez anos. Gosto de ir lá, e sou um cliente fiel e frequente. Conheço-os a todos pelo nome
e sinto que há uma relação familiar com as pessoas que estão atrás do balcão. Vou lá buscar as minhas vitaminas, o anticoagulante que tomo há sete anos devido a uma embolia pulmonar, o gel de
banho e alguns produtos para a pele.

Costuma vacinar-se contra a gripe?
Sim e faço-o na farmácia! Há mais de 30 anos que me vacino. Até sou capaz de ter tido gripe, mas não me apercebi porque quando somos vacinados os sintomas são muito mais leves.

Quais são os seus objetivos?
Quero viajar. Gosto muito de viajar pela Europa. Faço-o para ver uma ópera, um bailado ou um concerto. São sempre as mesmas capitais e as mesmas salas de espetáculos, mas vou como se fosse a primeira vez.

«já não tenho nada a provar a ninguém, a não ser a mim próprio, diariamente»

E também tem estado a escrever um livro?
Sim, é um projeto em que estou a trabalhar. Não é autobiográfico, mas antes um livro que cruza experiências televisivas com episódios da minha vida.

E vai continuar a fazer televisão?
Há um contrato para cumprir até ao dia 31 de dezembro de 2026, se as minhas condições cognitivas e físicas se mantiverem como estão. Depois disso, posso continuar ou não. Há muitos caminhos por onde ir. Quem sabe, posso vir a ter um podcast ou um videocast, logo se vê. Não faço planos para a vida porque, como dizia o Professor Agostinho da Silva, «a vida tem planos para mim».

Que mensagem gostaria de deixar às pessoas?
Sejam felizes, mas não esperem que a felicidade vos caia do céu. Vão à luta, sigam os vossos sonhos! Não se percam em coisas que não têm importância. Sejam curiosos. Vale mesmo a pena viver, é um privilégio.

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